Pular para o conteúdo principal

"Uma foto, mil lembranças": Sobre sonhos e memórias

(foto: Ricardo Perez)

Sabe quando você olha, ouve, lê uma pessoa e tem a impressão de que ela simplesmente parece ter nascido para fazer aquilo? Que tudo vem tão suave e naturalmente da boca dela e ela sabe a medida exata para fazer rir ou emocionar a gente? Essa foi sempre a impressão que eu tinha do Ricardo, quem conheço há muitos anos, de apenas conviver com ele, ver as coisas todas que ele faz na sua área do jornalismo e como diretor de tevê. Ao receber, porém, esta foto e este texto enviadospor ele para o concurso "Uma foto, mil lembranças" percebi que não era uma impressão meu sentimento, mas a realidade.

 O Ricardo tem esse poder de captar muito rapidamente coisas incríveis acontecendo ao seu redor e tem o dom do falar bem. Ele seduz pela imagem e pela palavra e isso vocês vão poder comprovar comigo nesta oitava participação do nosso concurso que promete dar trabalho para os leitores em setembro! E por isso Rico, muito obrigada!


Sobre Sonhos e Memórias


"Em “A Tempestade”, Shakespeare escreveu que “somos feitos da mesma matéria que nossos sonhos”. Muitas vezes, é possível sentí-los em movimento dentro da gente.


Não sou um homem de muitas memórias. Talvez por ser um aquariano convicto, sou pouco apegado a quase tudo – até mesmo (e por um erro que tento corrigir) às pessoas. Gosto das minhas solidões. E em algumas fases da minha vida, são elas que me trazem de volta ao eixo. Vivi 2 momentos únicos em que estar sozinho me fizeram bem: no começo de 2005, quando passei um mês na Argentina estudando espanhol e cultura latina e, cinco anos mais tarde, outros 35 dias me lambuzando de cinema em Nova York.


Vale dizer que quem já se meteu na confusão de metrôs e na frenética coreografia de pessoas daquela cidade, sabe que o centro do mundo fica bem longe a linha do Equador – mais precisamente numa ilha do nordeste americano.


E foi na Grande Maçã em que eu flagrei o casal da foto. Em plena Times Square, eles brindavam o que parecia o começo de uma fantástica história de amor. Eu não os conhecia. Nem viria a conhecer. Eles nunca viram a foto. E, muito provavelmente, não verão nunca. Mas no momento em que os cliquei nós nos unimos numa sensação de felicidade difícil de descrever. Éramos 3 desconhecidos, no centro do mundo, tão pequenos, tão anônimos e, ao mesmo tempo, gigantes. Tínhamos a dimensão dos nossos sonhos. Estávamos em contato com a tal matéria de que nos sugere Shakespeare. No meio daquele vai-e-vem de gente, dos flashs que não cessam, das filas dos musicais, dos encantamento dos olhares, da pressa dos que não estão ali a passeio, éramos só nos 3. Cúmplices. Sem saber de onde estávamos vindo, para onde iríamos, se falávamos a mesma língua, se alguém além de nós vivia algo parecido.


Mas voltemos à minha péssima memória. Lembro de muitas passagens da minha vida como pequenos fragmentos. Muitas imagens, alguns barulhos, poucos cheiros. E, quando estou sozinho, me aproximo mais deles. Mergulho entre todos e me refresco. Relembro de pessoas, das coisas boas que elas me disseram, do que aprendi, dos sorrisos, dos silêncios. Nestes momento, eu até (re)crio cenas e as tomo como se fossem verdade.


E foi por isso que escolhi esta foto. Nela só há lembranças que eu criei de um casal que não sei quem é. Pode ser que eles nem estejam mais juntos. Talvez tenha sido um grande fingimento aquele romance. Mas eles me fizeram sentir a felicidade na velocidade de um clique e ajudaram a imortalizar uma passagem única da minha vida."


Ricardo Perez.

Comentários

SENSACIONAL! Assim mesmo, com letras maiúsculas! Amei esse texto, tb tenho essa capacidade de captar flashes, só que com a memória e vou guardando nas minhas garrafinhas...aquelas de que falo no meu livro. Achei que esse texto do Ricardo tem muito a ver com é artista, sensível. Uma coisa que pode passar imperceptível ao olhar dos outros, pra nós ganha um significado muito maior. Amei! beijos aos dois...vc tem razão Soníssima, escolher um texto entre tantas maravilhas vai ser difícilllll,bjs
Dri Cechetti disse…
Lindo e sensivelmente tocante!
Beth/Lilás disse…
Nossa, isso aqui vai ficar difícil para escolher!
Também adorei seu texto Ricardo, você foi bem mais além do que o teu olhar solitário através da câmera. Você interpretou o mundo e as palavras do grande Shakespeare naquele momento único.
E como escreve bem este rapaz!
parabéns!
beijos cariocas

Postagens mais visitadas deste blog

"Em algum lugar sobre o arco íris..."

(I srael Kamakawiwo'ole) Eu e Renato estávamos, há pouco, olhando um programa sueco qualquer que trazia como tema de fundo uma das canções mais lindas que já ouvi até hoje. Tenho-a aqui comigo num cd que minha amiga Janete me deu e que eu sempre páro para ouvir.  Entretanto, só hoje, depois de ouvir pela TV sueca, tive a curiosidade de buscar alguma informação sobre o cantor e a letra completa etc. Para minha surpresa, o dono de uma das vozes mais lindas que tenho entre todos os meus cds, não tinha necessariamente a "cara" que eu imaginava.  Gigante, em muitos sentidos, o havaiano, e não americano como eu pensava, Bradda Israel Kamakawiwo'ole , põe todos os estereótipos por terra. Depois de ler sobre sua história de vida por alguns minutos, ouvindo " Somewhere over the rainbow ", é impossível (para mim foi) não se apaixonar também pela figura de IZ.  A vida tem de muitas coisas e a música é algo magnífico, porque, quando meu encantamento por essa música come

O que você vê nesta obra? "Língua com padrão suntuoso", de Adriana Varejão

("Língua com padrão suntuoso", Adriana Varejão, óleo sobre tela e alumínio, 200 x 170 x 57cm) Antes de começar este post só quero lhe pedir que não faça as buscas nos links apresentados, sobre a artista e sua obra, antes de concluir esta leitura e observar atentamente a obra. Combinado? ... Consegui, hoje, uma manhã cultural só para mim e fui visitar a 30a. Bienal de Arte de São Paulo , que estará aberta ao público até 09 de dezembro e tem entrada gratuita. Já preparei um post para falar sobre minhas impressões sobre a Bienal que, aos meus olhos, é "Poesia do cotidiano" e o publicarei na próxima semana. De quebra, passei pelo MAM (Museu de Arte Moderna), o qual fica ao lado do prédio da Bienal e da OCA (projetados por Oscar Niemeyer), passeio que apenas pela arquitetura já vale demais a pena - e tive mais uma daquelas experiências dificilmente explicáveis. Há algum tempo eu esperava para ver uma obra de Adriana Varejão ao vivo e nem imaginava que

"Ja, må hon leva!" Sim! Ela pode viver!

(Versão popular do parabéns a você sueco em festinha infantil tipicamente sueca) Molerada! Vocês quase não comentam, mas quando o fazem é para deixar recados chiquérrimos e inteligentes como esses aí do último post! Demais! Adorei as reflexões, saber como cada uma vive diferente suas diferentes fases! Responderei com o devido cuidado mais tarde... Tô podre e preciso ir para a cama porque Marinacota tomou vacina ontem e não dormiu nada a noite. Por ora queria deixar essa canção pela qual sou louca, uma versão do "Vie gratuliere", o parabéns a você sueco. Essa versão é bem mais popular (eu adorava cantá-la em nossas comemorações lá!) e a recebi pelo facebook de minha querida e adorável amiga Jéssica quem vive lá em Malmoeee city, minha antiga morada. Como boa canção popular sueca, esta também tem bebida no meio, porque se tem duas coisas as quais os suecos amam mais que bebida são: 1. fazer versão de música e 2. fazer versão de música colocando uma letra sobre bebida nela. Nest