(Amantes na pintura luar, Marc Chagall)
Perguntei depois, quando nos encontramos, um pouco mais sobre os ocorridos e para saber o que de concreto estava acontecendo para tentar entender um pouco as coisas e dar algum palpite...
Então ela emendou numa porção de "acho que ela não liga", "acho que ele está cansado de mim", "acho que não sou boa mãe, nem boa mulher, nem boa filha...", "acho que o pessoal do trabalho não me valoriza como profissional"...
Foi quando me lembrei de algo aprendido estes dias num curso para o qual um amigo me convidou. Todos nós temos algo em comum: uma história. E, embora cada um de nós tenha uma história diferente para contar a verdade é que quando se trata de entender a própria história, o passado, todos nós reinventamos as coisas a nossa maneira.
Há os fatos e eles são objetivos. Há, por outro lado, a nossa interpretação dos fatos e nossa versão de como contar os fatos. Recontando o acontecido acabamos por "criar" uma nova realidade. Um exemplo lindíssimo dado por Fernando Camacho, o palestrante: quando tinha 15 anos, em viagem de férias com sua mãe, seu padastro e seus meio irmãos, Fernando ouviu do padastro a seguinte frase: "As únicas pessoas que realmente importam na minha vida são a sua mãe e meus filhos".
Qual foi a história recontada pelo adolescente para ele mesmo? Que se o pai havia dito que amava apenas os filhos e ele não era filho legítimo, então, obviamente, ele não o amava. Ele estava fora da família e tudo só porque não era filho verdadeiro. Não poderia receber o amor daquele homem. Tudo era fingimento...
Por mais quase 15 anos o moço ficou recontando essa verdade mentirosa a si mesmo até o dia em que acordou de uma cirurgia e a primeira pessoa quem estava ao lado dele, ali esperando a anestesia passar era o único pai que ele conhecia, seu padastro.
Naquele minuto o menino, já homem, compreendeu como havia sofrido em vão todos aqueles anos. Como havia afastado de si amigos, amigas, família, amores por conta de achar que não podia se entregar. Por conta de acreditar que não merecesse o amor de alguém ou que este alguém lhe faria sofrer um dia dizendo: "eu não o amo!".
Fernando reatou com seu padastro. Não a mesma relação, mas uma muito mais segura, próximo e verdadeira.
Lembrando dessa história eu a contei a minha amiga e algumas lágrimas rolaram em seu rosto moreno. Ela não me disse muito, mas eu percebi como ela também compreendera que algumas das histórias as quais ela vinha remoendo e se contando não passavam na verdade de meias histórias.
Comentários
Eu costumo dizer para mim mesma que não estou no centro do universo, quando me deparo a ter pensamentos muito semelhantes aos da tua amiga. Não estou a pensar como o outro e estou apenas focalizada na ....minha parte da história ou na minha versão. Quando isso acontece reparo que me entristeci em vão, tudo tem uma importância relativa.
PS: acabei de fazer um post sobre o concurso. Já escolhi a foto, agora só falta "pôr a música para tocar e me isolar para deixar as memórias fluirem.
Vou enviar este seu texto para ele.
um beijinho carioca carinhoso
Adoro seu blog e suas letrinhas!
beijo :*