(Museu Des Invalides, foto de Dri Cechetti, antes de minha chegada, agosto de 2009)
A primeira coisa que aprendi quando voltei de minha (até tardia, mas antes tarde do que nunca!) primeira viagem internacional, em 2003, foi que não dava e não adiantava tentar contar tudo. Percebi que ninguém entenderia o que havia se passado naquela viagem. Foi o que ocorreu quando fui mostrando as fotos de Lisboa, um lugar que só de falar o nome eu ouço o fado no meu ouvido, bem como quando mostrei as fotos de Madri, onde gastei mais horas dentro do inesquecível Museu do Prado do que pelas ruas e em Paris, o lugar de sonhos onde nossa viagem terminara naquele ano.
Lembro-me de mostrar o álbum e dizer: "Mas esse monumento era muito, muito grande...", tentando explicar a sensação que fora estar diante daquilo. Entre todas as imagens, o Jardim de Versailles era a coisa que mais tinha me deixado estonteante... Havia sido tão maravilhoso ter estado lá, sentir-se um grão no meio daquele imenso e indescritível jardim que eu tentava e tentava passar algo do que havia vivido, mas era mais ou menos em vão...
Só estando em frente a uma coisa assim que você entende o intuito de quem a projetou, ou você pode entender um pouco do que leu nos livros e dividir um pouco do sentimento que a humanidade tem ao visitar aquele lugar... Contudo, a experiência ainda é totalmente pessoal e então, era difícil ser entendida, ainda que a pessoa soubesse do que eu estivesse falando.
(Vista do Jardim de Versailles, olhando do Palácio, foto de Dri Cechetti, antes de minha chegada, agosto de 2009)
(Eu e "mon amour" no lago do Jardim de Versailles, setembro de 2003)
Uma viagem é assim, principalmente se você se entrega a ela. Principalmente se você está aberto a qualquer coisa que aconteça e se olhar com o coração qualquer coisa que lhe passe pelos olhos. Então é possível querer recontar, e é delicioso que alguém queira ouvir, mas a gente sabe que é uma parte daquela enorme coisa que te aconteceu por dentro que você tenta dividir. Depois de uma grande viagem (não precisa ser internacional, precisa ser para fora de si mesmo), principalmente as primeiras, nós nunca mais somos os mesmos e o mundo nunca mais será visto com os mesmos olhos, a mesma cabeça.
"Viajar é preciso" sim, mas é impossível prever o que vem pela frente depois... Nós mudamos para rumos inesperados e tomamos a coragem dos grandes navegadores.
Lembro-me de minha primeira saída sozinha para "longe" de casa, aos 17 anos. De violão nas mãos, indo para um retiro espiritual no interior de Bragança eu rezei sozinha no ônibus: "Meu Deus, ajude-me a ser sempre alguém que sai e descobre o mundo", tal era a sensação maravilhosa que me continha...
...
Minha quarta (ou quinta, juro que não consigo saber) viagem a Paris terminou seu primeiro dia na torre do Museu Pompidou e o dia havia sido tão intenso que meu diário de bordo havia parado na chegada de trem. Eu já havia estado lá numa de minhas idas à cidade e visitado Mondrian, Picasso, Miró, Dali e tanta gente que já havia estado comigo em momentos só meus no Brasil. Dessa vez, a Dri, que é bem antenada e espertinha, tinha feito reservas para o restaurante que fica no topo daquele prédio vermelho, cheios de vidro, super moderno. Subimos pelas centenas de escadas rolantes transparentes, olhando ao longe a cidade iluminada. Ao ver a Torre, a Sacre-Coeur ficamos dando pulinhos, gritinhos caipiramente deliciosos de alegria.
Tudo parecia tão perfeito que me senti literalmente dentro da "Noite estrelada" de Van Gogh.
Subimos, subimos e subimos. A francesinha da recepção do resturante me atendeu com um "Bon soir" e eu fingi falar a língua assim como fingi falar sueco direito com o motorista do ônibus em Malmö. Não durou mais que três segundos e emendei no inglês. Tomamos nossa mesa e começamos a noite...
O restaurante ficava no topo a céu aberto e comi a carne mais macia do mundo e a Dri uns camarões lindíssimos. Esse foi nosso único "luxo" da viagem. No mais, passamos com crepes e sanduíches pelas ruas, mas valeu cada centavo pago por aquele jantar no Centre Pompidou.
(Vista do alto do Pompidou, la Torre Eiffel, foto de Dri Cechetti Paris, agosto de 2009)
(Vista do alto do Pompidou, ao longe a inesquecível Notre Dame, foto de Dri Cechetti, Paris, agosto de 2009)
De longe podíamos ver os pontos mais conhecidos no mundo, lá quietinhos, iluminados, cheios de história para contar e a gente cheias de vontade de ouvir.
Suspiramos milhares de vezes, felizes e radiantes da vida. Relembramos nossas saídas em Sampa, pela Vila Madalena, e refizemos nossos caminhos até ali. Talvez uma das coisas mais incríveis de conhecer lugares novos ou fazer viagens diferentes seja sempre essa revisão, seja sempre olhar para o próprio caminho e reconhecê-lo como importante.
Essa era a primeira vez que eu estava olhando a cidade de Napoleão sem meus dois heróis. Antes, Ângelo não existia, mas havia sido eu e Renato lá. Agora eu tinha os dois e era totalmente diferente das vezes anteriores e me senti um pouco orgulhosa de minha própria caminhada. Senti-me também orgulhosa de brindar o vinho branco com a Dri, no meio de gente do mundo todo que também fazia sua história por ali. Senti-me infantilmente feliz no meio daqueles garçons que parecem sempre muito chiques, já que quem fala francês sempre parece chique mesmo se estiver falando que a descarga do banheiro está entupida.
Pelo celular eu falara com Renato minutos antes. Ângelo já estava dormindo e eu, ainda que com saudade, senti que aquele momento era meu e isso não excluía os dois. Nada de culpa, nada de pena. Re estava feliz de ter cuidado bem do menino e contou as peripécias dos dois pelos parques da cidade nas atrações do MalmöFestivalen.
Meus pés doíam da caminhada do dia, pois havíamos andado e pedalado por horas. O calor dessa época não deixa os passeios a pé tão agradáveis. Prefiro mesmo viajar na Primavera, quando não o ar não sufoca, mas foi a chance de usar vestidinho de alça e chinelos, coisa que na Suécia só é possível poucos dias do ano.
Eu refiz quase todos os lugares que eu já conhecia, mas não sei se porque amo mesmo o lugar ou se o fato de ser a primeira vez da Dri na cidade e sua empolgação com ver tudo que ela ouvira falar nos guias e das pessoas que tudo ainda me pareceu tão excitante.
Os piqueniques (se você vem à Europa, você precisa - tem que! du måste! - fazer piquenique) estão entre as coisas mais boas de se fazer por Paris. Pode-se fazer em qualquer parque, gramado, em frente aos monumentos espalhados pela cidade. Compramos uma baguete com uns breguetinhos deliciosos de um francês metido a chef e trouxemos tudo debaixo do sovaco, tudo igualzinho aos franceses. Enchemos de queijos deliciosos e acompanhamos com um vinho de 3 euros comprado na vendinha do Senhorzinho da esquina.
Só para ilustrar a importância desse tipo de celebração ao ar livre, em uma vendinha, no dia seguinte, a Dri, que é a cara de pau mais bem sucedida que conheço, pediu pro tiozinho colocar o vinho na geladeira dos refrigerantes, porque a garrafa estava quente demais. O homem, que me pareceu de algum lugar do Oriente Médio, não sei dizer direito, não entendeu bulhufas, mas deixou a folgadinha usar a geladeira. Esperamos um tempo do lado de fora e fomos para o piquenique da noite.
(O povo todo subindo pelo Champs Elysee em direção ao Arco do Triunfo. E nós atrás... Paris, agosto de 2009)
Eu não me lembrava mais, mas é possível alugar bicicletas, espalhadas pelas ruas de Paris, pagando-se muito pouco e com uma comodidade incrível. Além disso, dá uma coisa boa demais sentir o vento no rosto e explorar os pontos da cidade sem estar trancado dentro dos metrôs.
Agora que eu sou craque em bikes foi fácil e aventuristicamente delicioso ir do Quartier Latin até o Arco do Triunfo. Subindo pela Champs Elysee, entre os carros, entre os monumentos todos eu e Dri éramos as próprias donas do mundo.
A única coisa "chata" era que o calor era tanto, tanto que parávamos o tempo todo para abastecer de água, coca ou sorvete.
Do arco, deixamos as biciletas (que você pode sempre devolver em qualquer um dos pontos de bikes que tem pelas ruas) e fomos de metrô até Montmartre. Pra mim, Montmartre é puro Impressionismo. Eu não consigo estar lá sem ficar imaginando o Monet, Manet, Pisarro e tantos outros tentando pintar seus quadros. Eu sempre encontro Vang Gogh angustiado e sedento por ser compreendido pelas ruas. É como se eu pudesse andar entre o passado, estando no presente.
(Vista da Sacré-Coeur, Paris, agosto de 2009)
("Borboleta pequenina" que saiu fora do rosal... Sacre-Coeur, Paris, agosto de 2009)
Além disso, ainda tem a maravilhosa sensação de estar diante da branca e exuberante Sacre-Coeur que é mais linda por fora do que por dentro, é verdade, mas sempre imperdível. Dri deitou-se na grama, relax como há tempos eu queria vê-la. Em paz...
("A paz invadiu o meu coração... de repente me enche de paz... Dri em frente Sacre-Coeur, Paris, agosto de 2009)
Pedi a um "talvez italiano" sozinho que estava com uma baita câmera poderosa na mão que tirasse uma foto nossa. Segundo a Dri, esse é o melhor esquema para ter boas fotos de viagem, quando você não tem como fazer a foto sozinho. E o rapaz, vai ver que contagiado pela nossa beleza, cortou metade da Igreja numa foto e nossos pés em outra. Ele conseguiu ao mesmo tempo estragar a lembrança e jogou por terra a teoria da pobre da mocinha.
Voltamos andando com calma, entre as lojinhas de artistas, entre gente circulando. Comemos nosso crepe de chocolate (um entre muitos dos quais não tenho nenhuma foto) e fomos andando em direção ao hotel. Ali mesmo onde tanta gente por quem sou apaixonada também viveu e circulou. Era hora de tomar banho, perfumar-se, pôr um vestido caprichado e ir - a pé- claro! para nossa noite inesquecível na Torre do Pompidou. Um jantar a duas nos esperava e havia muito ainda para viver e sentir nas próximas horas corridas que nos esperavam...
...
* As fotos são minhas ou da Dri, obviamente, mas fiz questão de citar o nome dela nas paisagens tiradas por ela para não ficar com os créditos e louvores para mim.
Comentários
Viajei, viajei com você literalmente.
Isso sim foi aproveitar Paris de uma forma bem parisiense, integrada com o jeitão da cidade. Ainda bem você treinou batante com sua Madalena lá em Malmo, assim pode ficar desfarçada no meio dos franceses, ainda mais com este vestido de bolinhas bem frufru, parecendo uma pin up contemporânea.
Belíssimas fotos que a Dri fez e você, poderia fazer um livrinho e mandar editar com estas estorias que conta sempre pitorescamente das suas viagens. Estou lendo um livrinho da Danuza Leão que é justamente sobre as viagens dela pela Europa e o jeito dela contar não é nem de longe melhor que o seu.
beijos grandes cariocas
É muito gostoso!!
Senti toda paz e a belezura desse lugar, invadiu minha alma!!
ô beleza!!
adorei tudo!!
bjks
Vc escreveu tão bem que bateu a maior saudade de cada momento especial que vivemos....
Com certeza, nunca mais serei a mesma depois dessa viagem.
Bonjour!
Dri
Nossa me emocionei lendo o diário, confesso viajei junto, senti até o gosto do vinho, hehehe.
Lindo passeio, lindo mesmo. Viajar é tudo de bom e se unir a isso Paris, nossa é sorte grande.
Beijos
quatro fofas de marre de si,
obrigada e viajar com voces e sempre muuito bom!
alias que eu nao sei que seria de mim sem minhas companheiras de viagem virtual!!!
e tao bom saber que posso contar porque vai ter alguem ai para ouvir...
e Lilas, um dia eu ainda credito em voce em sua BRUACAhahahahaha e vou pensar que escrevo mesmo bem!
e uma delicia contar, mas bom messs seria voce ter um blog seu e contar sua versao... a minha leitura e claro deixa muito a desejar se eu pensar que ainda tem o seu olhar de tudo...
bom seria tudo junto! bjs
E que bom que o pessoal gostou das fotos, assim eu fico sem peso na consciência de ter feito um baita investimento na câmera! Hahaha...eu sabia que seria útil!
Bjs,
Dri
Estava sumida do teu blog por causa da mudança e do começo das aulas, mas pretendo voltar à atividade. rsrs Gosto de vir aqui porque sempre saio com alguma coisa pra pensar, pra avaliar o que tenho feito ou como tenho vivido. Obrigada por esses momentos. :)