(O Lavrador de café", Cândido Portinari, 1934)
Gente, eu havia programado de escrever um post comentando a poesia "Modernidade" do post anterior, mas a Irene mandou um comentário tão bom que acho que quero começar por ele.
Além de comentar outros aspectos da paternidade e maternidade, ela disse:
"Eu nunca vi uma mãe, negra, com uma babá, branca, passeando no shopping. Moderninade só se for o shopping."
A percepção da Irene sobre a única coisa que tem de moderno no poema foi ótima.
Lembro de alguns alunos meus na aula que dei sobre esse poema, dizendo que era moderno porque uma mulher branca e uma negra hoje em dia podem trabalhar juntas, serem amigas e passearem no shopping, mesmo uma sendo empregada da outra.
Lembro também que quase chorei com essa leitura, inclusive porque é bom ressaltar eu dava aula para alunos que queriam entrar numa universidade, eu dava aula em cursinho...
Bom, acho que esse poema traz aquela questão que a gente debateu bastante esses dias, sobre a importância de curtir os filhos crescendo, sobretudo no nosso tempo livre, já que a vida exige que abramos mão do resto todo. Creio, porém, que a autora faz uma brincadeira com o título "Modernidade" e uma crítica muito forte à estrutura social brasileira.
Ainda em tempos tão modernos, nos quais passeamos em shopping center luxuosos, as diferenças educacionais, culturais e econômicas deixam transparecer centenas de anos de discriminação pela cor. Essa cena, corriqueira, parece não incomodar mais ninguém. Ainda que a babá nunca possa entrar numa loja do mesmo shopping que a patroa e comprar umas coisinhas para seus moleques, elas caminham lado a lado, como amigas ou boas companheiras.
Se há um trocadilho meio irônico com o título, o poema faz outros trocadilhos não só irônicos, mas também tristes. O fato das duas mulheres, uma branca, uma negra, estarem passeando juntas e o fato de que "vão no maior ti ti ti", não significa algo positivo. A roupa branca da babá, uniforme que marca a condição de empregada e de inferior na relação com a outra, em contraste com a roupa preta, sinal de elegância, da mãe, mostra que o ti ti ti é apenas ingênuo. Ou falso.
A tristeza fica por conta de nem a mãe branca parecer se dar conta de que repete uma história de dominação e um papel tão antiquado, como o da mulher rica que tem a "escrava" negra e nem a empregada negra que sua situação possa ser tão miserável.
Na descrição do poema, a mãe está em momento de lazer, mas traz sua "mucama". Ela tem seu bebê querido no carrinho o qual ela nem mesmo faz questão de empurrar.
A miséria está em não reconhecermos em cenas assim algo tão arcaico, tão consolidado e tão difícil de ser questionado.
A gente não questiona porque já se acostumou. A gente não questiona porque não quer ter um dia triste e cheio de preocupações mais além daquelas que já temos e porque posts alegres dão mais ibope. A gente não questiona porque sabe que é algo bem difícil de se mudar. A gente não questiona porque conhece gente que gosta e que faz o mesmo. Ou... a gente não questiona porque faria o mesmo, sendo brancos ou negros, desde que tivesse dinheiro e que "precisasse".
O grande valor desse poema anônimo é que ele faz e força a gente a questionar.
...
A semana aqui está com milhares de tarefas para eu cumprir, sem marido e com Angelinho ficando doente. tchau! tchau! beijos!
Valeu!
Comentários
Sabe, eu tenho uma amiga que mora em Malmo, a Pia. Ela é sueca. Estudamos juntas na sétima série. Mas faz uns anos perdemos contato.
sabe que uma das coisas que mais me incomodou nessa visita ao nosso Brasil foi ter alguem para empacotar minha compra? Juro!
e fui num mercado que tinha 24 caixas e 24 empacotadores as 9 da manha... numa praia cara... e eles estava parados, sem fazer nada porque o mercado ainda tava vazio... E exatamente porque eles tem o salario de miseria que voce disse... e claro que ta todo mundo pensando: "sorte deles que tem!"
Ah! me da o nome inteiro da sua amiga que aqui na suecia e facilimo de achar alguem... e so eu jogar na internet o nome completo dela que eu devo conseguir achar telefone e endereco. tem uns sites daqui especializados.