(Eu, com uns não sei quantos anos, há um certo tempo atrás)
Desde uns anos atrás, quando encontrei esta foto, num binóculo perdido nas coisas de minha mãe, eu a carrego comigo.
Deve ser uma das duas únicas que meus pais tiraram de mim quando pequena, já que, na época, fotografia ainda era uma coisa muito cara para as posses deles. E, embora eu conhecesse o tal binóculo desde criança, foi só na "madureza" que eu passei a valorizar a imagem que ele carregava.
O fato é que eu amo esta foto.
Amo fotografias, álbuns de família, de um modo geral, mas esta eu acho especial.
Foi a partir dela, que minhas memórias, esquecidas na infância, vieram à tona um dia.
Olhando-a, lembrei-me do lugar onde morávamos, a Chácara do Sr. David, que ficava na região de Campinas.
Lembrei do mato e das aranhas que minha mãe tanto temia naquele lugar.
Lembrei de algumas noites em que ela e meu pai, ficavam à minha volta, me cuidando, enquanto meu nariz sangrava não sei porque cargas d´água.
E vendo os brinquedos que me eram caros, colocados à minha volta, lembrei-me também de como era delicioso esperar pelos presentes de Natal que a Singer, empresa onde meu pai trabalhou vinte e tantos anos, como metalúrgico, dava pra gente no fim do ano.
Lembrei-me ainda das visitas que fazíamos à empresa e do orgulho de meu pai a me mostrar seu local de trabalho. O fogo, os caldeirões, a força que eu pensava que era preciso meu pai ter para operar tudo aquilo, tudo... me dava muito orgulho dele.
Foi nesta fotografia borrada da infância que eu me vi pequenina e cuidada.
E eu, que agora sou mãe, percebi que lindo um dia ter sido filha.
O vestidinho xadrez com o cintinho, a o lacinho, a bolsinha e a sandália... tudo combinando. Tudo escolhido a dedo por minha mãe, talvez por meu pai também.
O cabelo, cortado láá no toco pela minha própria mãe e eu, com cara de poucos amores, mirando o fotógrafo.
(Meu pai, visivelmente orgulhoso de me conduzir e eu segura de tê-lo ao meu lado)
São lembranças assim que essa fotografia manchada me traz. Lembranças que, na verdade, não tenho direito, mas que, de alguma forma, estão em mim.
A partir dela eu me consigo ter uma idéia do cuidado, do amor, da dedicação que por muitos anos meus pais me dedicaram. Quantas incontáveis coisas não fizeram por mim que eu nunca saberei? Quantos sonhos construíram em torno da minha presença, os quais eu provavelmente não cumpri?
A partir desta foto, e das memórias recuperadas a partir dela, percebo que o amor que hoje eu e Renato doamos ao Ângelo, ficará nele, de uma forma ou de outra. Na dúvida, eu estou tirando muitas fotos...
No dia de hoje, domingo chuvoso, 3 graus no termômetro, Ângelo e Renato ainda dorminhocos, eu percebo que ser mãe, por estranho ou comum que pareça, me tornou muito melhor filha, Hoje consigo entender algo que me era impossível até pouco tempo atrás: o quanto se despende de energia para cuidar de um filho, e o quanto é possível amá-lo e querê-lo bem. Entendo, ainda, como é bom demais poder perceber o valor dos pais e amá-los enquanto é tempo.
(Minha mãe e minha irmã, chorando de rir, com as fraldas do boneco, em chá de bebê do Júnior)
Comentários
Beijos!!!!!
Irene
Lembrança é mesmo tudo de bom, nesses dias em que fiquei em Campinas pudemos lembrar tanta coisa, é bom demais....
Um grande beijo pra vocês e obrigada por fazerem parte doque serão minhas lembranças de amanhã!!!!
Myrna
eu não ia dizer, mas minha mãe era alta conhecedora da tecnologia cabelística da época... conseguiu transformar meus fios pretinhos nessa cabeleira loira... vai ver era tecnologia sueca! rs
Somos todos lembranças um do outro!!!
bom ne??
Fico feliz que a idéia do chá do seu bebezinho tenha te trazido até aqui! E fico feliz mesmo que voce tenha gostado e se identificado com esse texto...
é um dos que eu mais gosto e dos quais mais me emocionei escrevendo!
como voce é mãe, creio que consegue sentir bastante do que escrevi como sendo algo que vc tambem vive! com os filhos a gente aprende a valorizar o amor das mães, ainda que a gente viva tendo desacordos. Eu e minha mãe pensamos muuuito diferente até hoje... cada qual acredita numa coisa, mas a gente tenta aproveitar o pouco tempo que temos juntas para só curtir a companhia uma da outra.... acho que o tempo vai ensinando isso.
Voce e sua mãe com certeza logo passarão por essa chateção e tudo volta ao amor de antes!!! tenho certeza!!! beijos
Pois é, te leio mas nunca comento. Nunca comento por comentar, apesar de achar interessante o que escreves e de gostar da maneira com que fazes isso.
Desta vez Somnia, eu quis escrever pra ti. Pra te dizer que teus textos são encantadores, que escreves leve e fluído e que, de uma maneira que não sei te explicar direito, me sinto ligada a ti, a tua história. Parece que um laço invisível saiu daqui de Floripa e atou aí na Suécia, através de teus textos. Pensando melhor no que esse sentimento de enlaçamento me diz, chego a conclusão de que ele se traduz em uma palavra: admiração.
Acredito que o que é bom e elogioso deve ser dito - ou escrito - sempre, sem pestanejar. Se assim acontecesse quem sabe o mundo seria mais amoroso? Fiz a minha pequenina parte com a borboleta pequenina que Somnia na Suécia e encanta mesmo quem está tão longe!
Um sábado insuspeito e, fazendo leituras aleatórias, encontrei este e outro post seu (http://borboletapequeninanasuecia.blogspot.com/2010/06/celebrando-liberdade-sobre-o-casamento.html) que -- acredite -- deixaram meus olhos marejados de um choro inesperado.
Ultimamente, eu ando mais sensível que o costume. Acho que estou descobrindo (ou reencontrando?) esses sentimentos tão caros a nossa condição. Muito bom se reencontrar nos outros em sábados insuspeitos.
Fique bem,
Beijo.