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Do lixo ao luxo, parte 2: tendências "cabeça"

(De Paulo Coelho a Dante e Nietzche: "Assim falava Zaratrustra", "A Divina Comédia" alguns das dezenas de livros que peguei em meu lixo, títulos em sueco e inglês, Malmö, novembro 2009)


Uma das idéias mais fortes que assimilei nos últimos tempos foi que especialistas de tendências e meio ambiente estão provando que nossas atitudes de ser, viver e consumir precisarão passar por uma mudança radical para que a vida no Planeta sobreviva.

Entre tais tendências de comportamento lembro-me de que comprar produtos de segunda mãos era a mais forte delas, algo que vem acontecendo entre peguenos grupos, normalmente em países de primeiro mundo.

Uma jaqueta valerá cada vez mais pelo valor passado que teve. Haverá marcas e assinaturas nas roupas para provar que o tempo que ela tem "vivido". E quanto mais usada, mais valor comercial terá.

Comprar trecos e bugigangas será considerado crime e, em pouco tempo, os países precisarão ter medidas muito fortes contra o comércio desandado e o acúmulo irresponsável de lixo.

Eu já havia falado no primeiro post dessa série "Do lixo ao luxo", como transformei um móvel sem graça encontrado no lixo do meu condomínio em algo que tenha a ver comigo e minha casa.

(O móvelzinho antes e depois da decoupage, Malmö, novembro 2009)

E também já havia dito que minha paixão por lixo, antiquários, sebos, brechós etc é antiga. Quando Renato me contou o resultado dessa palestra com super especialistas de tendências para o futuro senti que estava no caminho certo.

(Mesinha vermelha com xícara pintada a mão inglesa, pegas na semana passada, Malmö, março de 2010)
Malmö, uma cidade com 300 mil habitantes, tem em seu centro comercial (até onde tenho conhecimento) uns 15 second-hand. São lugares que recebem tudo quanto é tipo de doação, vendem e arrecadam dinheiro para enviar a países de terceiro mundo, incluindo a África e a América Latina.

Ainda assim, tenho vizinhos que apenas jogam lixos como os que vocês estão vendo nessas fotos, embora tenham carro ou telefone para avisar esses lugares que repassam o que ganham com o lixo para quem precisa.

É um lixo precioso e valioso. Embora algumas peças eu tenha como meta reformar e dar uma nova cara, fazendo arte com eles, inclusive vendendo-os depois, a maior parte serve para ser usada como está.


(Escrivaninha com os muitos livros, pegos no mesmo dia, mais a cadeira transformada por mim, Malmö, novembro 2009)

Além de valioso esse lixo é jogado numa ala especial, limpa, onde se jogam apenas material que não se sabe como reciclar.

Dias desses encontrei o mesmo lustre (lembram dele?) que eu recolhi e remontei do meu lixo numa loja de design dinamarquês e verifiquei que seu preço é de 600 reais. O mesmo para minha chaleira vedete, de outra de design dinamarquês super famosa daqui, Bodum, que custa em torno de 300 a 400 reais.

Eu sei que a primeira vista isso parece tudo caído do céu e que qualquer um, em meu lugar faria o mesmo. Essa, porém, não é a verdade.

(Mesinha simples e útil do IKEA, novinha em folha pro meu ateliê, Malmö, novembro 2009)

Meus amigos e amigas adoram meu lixo recolhido da minha "lojinha dinamarquesa" (já que grande parte do que pego provém de uma família dinamarquesa que vive aqui) e muitos até me pediram para repassar mais coisas se achar, mas a verdade é que eu conheço pouquíssima gente que tem a disposição ou o mesmo interesse que eu. Conheço meu professor de cerâmica e talvez outros que também vivam por aqui, além de minha ex-professora de pintura, Elô, que vive em Sampa. O que constato é que quase ninguém está disposto a fazer o mesmo.

Primeiro, porque dá trabalho. Eu carrego sozinha, limpo, dou uma consertada geral e aí arranjo em casa. Sempre penso numa utilidade para a peça e também se posso passá-la adiante. Já dei outras coisas que não tenho foto aqui para mostrar a vocês que também recolhi lá.


(O livro de receitas que não deve nem ter sido folheado mais a chaleira da Bodem, Malmö, novembro 2009)

Eu creio também que, para grande parte da população brasileira, acostumada a se guiar pelas propagandas e pelos modismos televisivos, pegar algo do lixo soa como algo de gente que não tem dinheiro para comprar o bom e novo em folha. Me lembro muito bem do comentário de alguém aí que me disse certa vez que se era verdade que eu ganhava dinheiro dando aula e fazendo mestrado então porque eu ainda não tinha um carro novo?

Pensar que milhões dos tais "europeus", por exemplo, aos quais as novelas sempre retratam como chiques optam por andar de bicicleta, tomar metrô e trem ou ônibus como atitude coerente com a necessidade do meio ambiente é algo que para muitos ainda soa como coisa de gente esquisita.

No Brasil está cada vez mais difícil optar por sistema público de transporte e chique mesmo é construir mais uma via na marginal Tietê...

Haha... Essa idéia de usar o meu carro, o meu isso e aquilo, ou de que quanto mais novo é o que tenho ou mais caro mais prova do quão importante eu sou está para lá de ultrapassada.


(Uma das duas poltronas totalmente novas que meu vizinho dinamarquês se desfes ,mais a mesinha, estatueta e tulipas de madeira, todas no lixo, Malmö, novembro 2009)

No fim do ano passado, antes de ir ao Brasil, visitei um second-hand bem bacana daqui, que só tem roupas e objetos caprichados, e comprei 2 vestidos bem de senhorinha para minha avó Maria, mãe de minha mãe. Eles tinham a cara dela e eu fiz questão de comprar lá porque minha avó sofre de Azheimer e sua memória tem a traído cada vez mais. Comprar algo que já tinha pertencido a outras pessoas, uma roupa que tinha, digamos assim, uma memória preservada foi exatamente meu intuito. E custou a mesma coisa que custaria numa loja de departamento daqui. Não era caro, mas não o preço não foi o que me fez comprar os vestidos.

A idéia de que preciso ter para ser é algo que por alguns cantos da Europa é um tanto diferente, embora eu também veja isso em muita gente, muitos de vocês aí pelo Brasil. Por isso os tais second-hand daqui estão sempre cheios de gente.

Essa é uma tendência totalmente contemporânea, necessária e urgente.

Todos nós sabemos que não se acha lixo como esse em qualquer canto, mas os brechós, antiquários etc estão aí fazendo o mesmo. Reciclar, reinventar é preciso e é delicioso. Experimente.

(Mesinha simples com a qual vou fazer uma decoupage toda de listras, Malmö, novembro 2009)

Comentários

Anônimo disse…
E não é muito mais gostoso ter algo feito - em partes - pela gente?
Talvez eu também já esteja 'assuecada' nesse lado, porque nada do que me dissesses me chocou (só a pergunta do carro novo, na verdade). Fiquei foi com inveja da tua vizinhanca! rsrs Aqui só vai pro lixo computadores quebrados, sabe como é condomínio estudantil! Só fico imaginando se algum dia os vizinhos de vocês entrarem aí e reconhecerem como um 2o apto. deles! rsrs
Uma iniciativa legal aqui do Kulturenshus de Luleå foi o 'dia da troca de livros', assim eu me desfiz dos que não queria mais e acabei com livros novos e interessantes.
E 2a mão eu adoro, adoro feiras também, e adoro pensar em como tal coisa ficaria com uma demão de tinta. Adoro transformacões, e me sinto a maior espertona quando compro algo baratinho mas que tem um grande valor na decoracão da casa!
Beijos!
Beth/Lilás disse…
Minha amiga borboletinha!
Esse teu post merecia ir parar num jornal para aguçar mais as consciências deste rincão varonil.
Aliás, tô mandando uma cópia para um Jornal daqui, quem sabe vc será contatada.

Você tem feito um lindo trabalho com estas peças rejeitadas por alguns daí que, embora morem num país tão responsável, ainda desperdiçam, compram muito e jogam fora coisas tão inteiras. Fiquei impressionada com o número de livros bons e intactos que também jogam no lixo, isso é imperdoável! Que coisa, o ser humano não muda tanto assim afinal!

Quanto à atitude em preservar o meio ambiente, usando os meios de transporte que temos ao invés de pegar o carro para ir logo ali, vou citar como exemplo meu querido marido que, embora tenhamos dois carros, um dele outro meu, ele vai todos os dias para o trabalho de ônibus até a estação dos catamarãs aqui e depois pega esta barca. Em volta desta estação tem um estacionamento gigante, cheio de carros bacanas das pessoas que vão de carro até ali para pegar os catamarãs, ou seja, quase ninguém pega ônibus para ir até a estação, tão perto. Precisam tirar seus carros da garagem e ir todos os dias até a estação, gastando combustível, poluindo e dando um nó no trânsito no final do dia.

Culpo também a forma de fazer política neste país que acha que incentivar compra de carros é uma boa e não fazem o que deve ser feito que é reforçar os meios de transportes para que as pessoas transitem sem tirar o carro da garagem.
Quando vc diz: "Essa idéia de usar o meu carro, o meu isso e aquilo, ou de que quanto mais novo é o que tenho ou mais caro mais prova do quão importante eu sou está para lá de ultrapassada." - Concordo plenamente, mas se der uma olhada na classe média e alta da Barra da Tijuca ou em Sampa nos redutos ricos, verá que é justamente o contrário que essa gente pensa, cada vez mais compram e trocam de carrões a cada ano.

E 'second-hand' sempre fui adepta, aprendi isto em Petrópolis, onde muitas lojinhas dessas nascem a cada dia, mas percebo que quem compra mesmo e dá valor são as pessoas mais esclarecidas ou com dinheiro, porque pobre e classe média deslumbrada odeia isso, diz que não compra nada usado, que não gosta das emanações que aquilo pode trazer para dentro de casa e assim
por diante.

No mais, parabenizo-a por uma mente tão aberta, clara e criativa. Sua casa tá ficando linda e ainda por cima com suas mãozinhas por todos os lados.
beijos cariocas
Luciana disse…
Parabéns pela atitude e por divulgá-la. Eu também tenho meus catados aqui, mas näo acho lixos como você acha. Já que näo acho fácil comprei coisas que precisava de segunda mão, pego livros que o povo näo quer mais, meus livros de norueguês do curso eu pego de segunda mão também, e salvei umas coisas que iam pro lixo de uma brasileira, a maioria eram roupas de criancas e eu repassei para outras pessoas que precisavam, já que não tenho crianca, mas do lixo dela eu salvei duas poltronas muito parecidas com a sua. Mas também já ouvi de pessoas que essa atitude de reaproveitar é coisa de miserável, mas acho miserável quem precisa comprar e gastar pra tentar ser alguém, sem observar como o mundo está.

Beijo
Françoise disse…
Que beleza de post, fiquei imaginando sua vizinhança....kkkkkkkk.
Continuo acompanhando e lendo tudo que vc escreve, sei o quanto é difícil as pessoas entenderem o que tentou dizer, cheguei aqui apenas 1 mês e infelizmente carrego comigo o medo de andar nas ruas, de estar sendo seguida, de largar minhas coisas e alguém pegar e assim vai..... Isso pois sou desencanada, deixo meu celular e minha bolsa em qualquer lugar, imagine quem não é??? Hoje mesmo o Marcio me perguntou o que os suecos devem pensar dos brasileiros, falou que carregamos conosco alguns rótulos e se sente mal com isso. Quanto as mudanças tenho ainda muito o que fazer e aprender, enquanto liderança de escola em bairros de periferia que sempre trabalhei o volume de trabalho é grande e a luta pela transformação na mentalidade das pessoas então....Começa mesmo pela cabecinha de muitos professores!Alguns acreditam que não podem fazer nada pois os alunos continuarão pra sempre coitadinhos de uma vida medíocre, o que querem é continuar oferecendo "arroz e feijão" a eles, parece que sentem prazer em observar a miséria, a falta de conhecimento e a ignorância das pessoas....
Não sabia que aqui haviam tantas lojas "second-hand" assim, isso p/ mim é uma festa, vi uma aqui ao lado do Mc'Donalds e já entrei umas 3 vezes para bisbilhotar, quando viemos p/ cá procurei por algumas na minha cidade pois precisava de casacos e achei apenas 2 mas nada consegui. Não tenho cursos mas adoro artesanato, vejo e vou logo me metendo a fazer. Minha primeira casa nao tinha armários na cozinha e fiz com caixas de bananas que peguei na feira e pintei. Só não conseguia fazer mais pois não tinha tempo(acho que tempo a gente arruma né?). Quanto ao lixo, no Brasil o que temos na verdade é preguiça de separar , pra mim está sendo um aprendizado, um treino e uma mudança de cultura, uma rotina que certamente deverá se tornar hábito.Sou muito consumista, agora estou aprendendo, quando casei comprava muita comida pois assim fui criada pelos meus pais, geladeira cheia era sinal de alegria. Ai que absurdo! Pra piorar hojé eu tô desse tamanhinho todo!!!Vivendo e aprendendo, sei que posso e tenho muito o que fazer por mim, pelas minhas filhas, pela comunidade em que atuo ....e assim vai.
Quanto ao nosso encontro, tô meio encrencada amiga. Ontem comecei a ter umas dores terríveis na barriga que até fiquei sem dormir. O pior é que me dá enjoô e indisposição. O Marcio achou que podia ser apendice mas é mais pra cima, acredito nao ser não. Hoje a dor ainda não passou , preciso melhorar se nao vou ter que procurar um médico por essas bandas. Mandarei notícias,
Beijos,
Fran
Somnia Carvalho disse…
Mariel,

trocar livros e otima ideia!!!

eu sei como e lixo e vida em moradia estudantil... rs...

meu armario na moradia da unicamp era todo feito com caixas de madeira vindas da feira? sabe?

eu pintei muitas de branco e fiz armarios... e ja naquela epoca viviamos do sofa pego no lixo etc etc...
Somnia Carvalho disse…
Lilla,

li seu comentario e fui correndo corrigir o texto, porque eu nao havia feito uma segunda leitura dele... achei um erro de coesao que me deixou nos nervos... rs

obrigada amiga!!! super incentivo esse! mesmo que nao publiquem, pelo fato de vc achar que merecia!

eu adoraria ser contratada por qualquer jornal ou revista... ja cogitaram materias especiais, mas ate agora acabou nao saindo nada...

beijos enormes!
Somnia Carvalho disse…
Lu,

acho sua atiutude louvavel! nao consigo imaginar umas roupas no lixao... sapatos se tem gente que pode aproveitar muito bem!

eu alias vivo trocando roupa, passo pra um pego de outro e assim vai...
Somnia Carvalho disse…
Fran, querida,

eu espero que sua dor no estomago passe logo ou voce ache um medico... se precisar de ajuda nisso me fala!

olha eu tenho pra mim que pode ser somatico... nervoso por toda essa mudanca, vc acha que nao? espero que nao seja nada grave...

assim que vc estiver melhor te levo pra conhecer um brecho aqui em malmo!
Somnia Carvalho disse…
Fran, querida,

eu espero que sua dor no estomago passe logo ou voce ache um medico... se precisar de ajuda nisso me fala!

olha eu tenho pra mim que pode ser somatico... nervoso por toda essa mudanca, vc acha que nao? espero que nao seja nada grave...

assim que vc estiver melhor te levo pra conhecer um brecho aqui em malmo!
Oi Somnia! Muito legal o que vc faz com seu lixo luxuoso! Quem dera que aqui a gente achasse essas coisas no lixo! Pode até ser que em Sampa se ache, mas no Rio e em Niterói..haha, só tem é tranqueira mesmo...hehe
Beijos.
Eveline disse…
Oi amiga, tudo?
Não fico pensando se sou ecológica ou não, mas meu marido e eu adoramos reciclar móveis e decoração, a família tira o maior sarro da nossa cara, pois a gente busca, limpa, pinta, transforma, dá um trabalhão, hehehehe, eles dizem que um dia vão colocar uma bilheteria na entrada da nossa casa, pois mais parece um museo, mas eu amo minha casa do jeito que nós montamos.
Minha irmã, algumas amigas e eu também montamos um brechó que ocorre umas 3 vezes por ano, com roupas, sapatos, bijus e decoração é um sucesso só.
Também gosto muito de comprar livros em sebo pois são mais baratos.
Se isso ajuda o planeta fico feliz, mas até hoje fiz pq acho que é o mais correto e casa bem com meu jeito de viver.
Muito bom o post, vale para refletir.
Beijos e te cuida
Maariah disse…
Fantástico Somnia. E acredito que as coisas tenham muito mais valor, têm a sua impressão lá, certo. E ficam lindas.
Boa noite!!!
Estava a procura de materiais feitos de lixo com uma finalização chic e parei por aqui.
Obrigada por divulgar.
Deus lhe abençoe sempre.
Se quiser me conhecer melhor vem pra cá:
http://pequenosgrandespensantes.blogspot.com.br/
Bjokas...da Bia!!!
Boa noite!!!
Estava a procura de materiais feitos de lixo com uma finalização chic e parei por aqui.
Obrigada por divulgar.
Deus lhe abençoe sempre.
Se quiser me conhecer melhor vem pra cá:
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Bjokas...da Bia!!!

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