Pular para o conteúdo principal

Criar é preciso ou Por que ainda escrevo este blog?

(Abstrato n.1, ainda nâo assinei nem dei nome às duas telas dessa fase, Somnia Carvalho, maio de 2008)


Eu acho que deve logo fazer um ano que comecei a escrever este blog.

Comecei no fim da gravidez, depois de ter enviado a tese para o Brasil. Quem me incentivou a escrever foi o Renato, porque eu vivia tentando atualizar meu orkut e ele insistiu que eu também devia me atualizar...

De lá para cá, tanta coisa aconteceu. Comigo, com todo mundo. E, de uma forma sutil, acho que o blog serviu para atualizar os amigos e os familiares sobre nossa vida aqui. Mas acho que, desde o início, os textos que escrevi e muitos outros que vieram depois, serviram mais para que eu tivesse um espaco para liberar minha criatividade. E nem estou afirmando que os textos eram criativos, mas eu, ao escrevê-los, conseguia extravazar parte do que sentia. Transformava o sentimento e a vivência em imagens, em cores de fundo do blog ou nos textos. Buscava poesias e histórias que gostava e dividia.

Mas esses dias que tenho ficado sem computador, desde que o meu quebrou, incrivelmente consegui voltar a pintar. É claro que hoje em dia é possível fazer isso porque Ângelo cresceu e a vida está alguns centímetros mais organizada. Entretanto, o que eu percebi é que preciso de uma esfera onde eu possa criar algo.
Aí no Brasil, às vezes, me dava na sapituca, como diz minha sogra aniversiariante de ontem, Irene, e eu pluft! pintava uma parede da sala de uma cor maluca. Invertia a posicao dos móveis e, no fim do dia, sentia como se tudo fosse outro. Uma energia brilhante passava pela casa. Era uma delícia.

Aqui, sem pintor para pintar depois, e com Angelinho, literalmente na barra da minha saia, o blog foi a maneira mais fácil de extravazar o meu "eu mesma". Só que eu tava lembrando o seguinte: minha mâe tem uma horta-pomar-jardim, onde ela gasta algumas horas de seus fins de semana. Onde ela ouve o canto dos pássaros e ora sozinha. Minha irma, a Sandra, faz bijuterias. E também adora inverter ordem de móveis e pintar paredes. O Lê, meu irmao, corra de kart. O Renato cozinha deliciosamente e adora criar pratos novos. Meu pai, voltava do trabalho, e tocava sua sanfona, tocava e tocava...


(Paisagem, sem assinatura e sem nome definido também, Somnia Carvalho, maio de 2008)



A verdade é que a gente precisa disso. A gente precisa dessa esfera libertadora da vida. Esse espaco só nosso, onde o outro nâo palpite. O Rê detesta que fiquem na cozinha enquanto ele cozinha, eu gosto de pintar e escrever o que me dá na telha, sem me importar muito se quem vai ver e ler vai gostar. A verdade é que o prazer vem enquanto eu faco a coisa. Se as pessoas gostarem, ótimo, delícia! mas a gente tem que ter um hobby pela gente mesmo.


E crochetar, e fazer aquele suéter trabalhoso que é uma coisa, para seu sobrinho, ainda que ele nunca use e ache horroroso. Consertar rádio velho, escrever artigos ou crônicas em seu próprio blog, ainda que você nunca seja reconhecido como o grande escritor que é, meu caro
Amigo Ed. Pintar, o que seja tem que ser bom porque é bom fazer. É por isso que, em cada horinha vaga, quando eu sinto um comichâo, corro e escrevo aqui algumas linhas.


Eu adoro quando vocês gostam, mas se vocês gostam ou nâo, já é outro passo, ou talvez, nem mesmo importe, porque esse momento aqui é só meu. E eu crio, ainda que muito simplesmente, eu me renovo, me sinto sempre mais eu e mais leve. Ainda que seja muito correndo, é muito bom.


Vendo as duas telas que pintei essa semana, estou orgulhosa. É a primeira vez que realmente crio um abstrato. E a paisagem daqui tem me dado vontade de pintar de um jeito diferente, com a espátula, me inspirando nas cores que tenho visto aqui. É claro que todo mundo, na intimidade, ou sem querer, sonha com o brilhantismo, mas ainda que ele nunca venha, esses momentos valem uma enternidade.


Coitadinha de mim pensar em me comparar ao incomparável e sensível Van Gogh, mas eu sempre me lembro do prazer que ele descrevia sentir ao pintar suas coloridas telas. Em "Cartas a Théo", que reúne as cartas que ele mandou, a vida toda, para seu amado irmâo, o que a gente percebe é que Vang Gogh pintava porque amava pintar. Ele pintava incasavelmente todos os dias. E criava. E ia para o campo. E sujava as mâos de tinta. E procurava pelos tons perfeitos. E Théo sempre lhe dizendo que ninguém ainda se interessara pelas suas telas. Mas Vincent nâo se conformava em pintar o que os outros esperavam que ele pintasse. Ele pintava como achava que deveria pintar. E, embora tenha morrido na pobreza e vendido apenas um quadro em vida, ele faz a gente suspirar, vibrar, chorar, ao ficar de frente para seus quadros, como fiquei no Museu Vang Gogh, em Amsterdâ.


Entao, eu penso que isso tudo, seu sucesso etc, só faz sentido porque, lá no seu momento criativo, Vincent conseguiu fazer de um pedaco de pano, um exercício de liberdade. E, apesar de eu estar muito longe de ser artista de verdade, é exatamente o que eu sinto quando pinto. E o que tento fazer, algumas vezes, quando aqui escrevo.

Comentários

Anônimo disse…
Os quadros ficaram lindos! Parabéns! Estou muito orgulhosa por vc tb!

Bjs,


Dri
Anônimo disse…
Amei os quadros!
Muitos beijos e saudades!!!

Myrna e Ana

Postagens mais visitadas deste blog

"Ja, må hon leva!" Sim! Ela pode viver!

(Versão popular do parabéns a você sueco em festinha infantil tipicamente sueca) Molerada! Vocês quase não comentam, mas quando o fazem é para deixar recados chiquérrimos e inteligentes como esses aí do último post! Demais! Adorei as reflexões, saber como cada uma vive diferente suas diferentes fases! Responderei com o devido cuidado mais tarde... Tô podre e preciso ir para a cama porque Marinacota tomou vacina ontem e não dormiu nada a noite. Por ora queria deixar essa canção pela qual sou louca, uma versão do "Vie gratuliere", o parabéns a você sueco. Essa versão é bem mais popular (eu adorava cantá-la em nossas comemorações lá!) e a recebi pelo facebook de minha querida e adorável amiga Jéssica quem vive lá em Malmoeee city, minha antiga morada. Como boa canção popular sueca, esta também tem bebida no meio, porque se tem duas coisas as quais os suecos amam mais que bebida são: 1. fazer versão de música e 2. fazer versão de música colocando uma letra sobre bebida nela. Nest

"Em algum lugar sobre o arco íris..."

(I srael Kamakawiwo'ole) Eu e Renato estávamos, há pouco, olhando um programa sueco qualquer que trazia como tema de fundo uma das canções mais lindas que já ouvi até hoje. Tenho-a aqui comigo num cd que minha amiga Janete me deu e que eu sempre páro para ouvir.  Entretanto, só hoje, depois de ouvir pela TV sueca, tive a curiosidade de buscar alguma informação sobre o cantor e a letra completa etc. Para minha surpresa, o dono de uma das vozes mais lindas que tenho entre todos os meus cds, não tinha necessariamente a "cara" que eu imaginava.  Gigante, em muitos sentidos, o havaiano, e não americano como eu pensava, Bradda Israel Kamakawiwo'ole , põe todos os estereótipos por terra. Depois de ler sobre sua história de vida por alguns minutos, ouvindo " Somewhere over the rainbow ", é impossível (para mim foi) não se apaixonar também pela figura de IZ.  A vida tem de muitas coisas e a música é algo magnífico, porque, quando meu encantamento por essa música come

O que você vê nesta obra? "Língua com padrão suntuoso", de Adriana Varejão

("Língua com padrão suntuoso", Adriana Varejão, óleo sobre tela e alumínio, 200 x 170 x 57cm) Antes de começar este post só quero lhe pedir que não faça as buscas nos links apresentados, sobre a artista e sua obra, antes de concluir esta leitura e observar atentamente a obra. Combinado? ... Consegui, hoje, uma manhã cultural só para mim e fui visitar a 30a. Bienal de Arte de São Paulo , que estará aberta ao público até 09 de dezembro e tem entrada gratuita. Já preparei um post para falar sobre minhas impressões sobre a Bienal que, aos meus olhos, é "Poesia do cotidiano" e o publicarei na próxima semana. De quebra, passei pelo MAM (Museu de Arte Moderna), o qual fica ao lado do prédio da Bienal e da OCA (projetados por Oscar Niemeyer), passeio que apenas pela arquitetura já vale demais a pena - e tive mais uma daquelas experiências dificilmente explicáveis. Há algum tempo eu esperava para ver uma obra de Adriana Varejão ao vivo e nem imaginava que