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A língua materna é como a casa da gente ou "O que é que a baiana tem?"


("Minha baianinha preferida", foto de Eric Feathers)

Essa semana foi incomum.
Em 10 meses em Malmö eu havia feito amizade com apenas uns quatro brasileiros.

Isso porque eu sempre sou do tipo que se optou por uma experiência quer a coisa toda. Com tudo que tem direito.
Por essa razão, morar fora do Brasil significa, para mim, mergulhar na cultura do outro país. Conhecer gente e lugares que me permitam sentir, ao máximo, a experiência de estar ali. E isso tem me levado a entrar em grupos de mães suecas, levar o Ângelo em atividades culturais daqui, tentar aprender a difícil língua etc.

Pelo mesmo motivo eu não entendo muito quem vive tanto tempo num lugar e ao menos não tenta aprender a língua local ou procura estar o tempo todo apenas com gente de seu próprio lugar ou então vive numa procura desesperada por manter sua vida "de antes" neste outro contexto, num saudosismo que, eu acho, deixa de ser saudável. Talvez eu só pense isso por estar aqui de passagem e não definitivamente. Talvez...

Por outro lado, eu "adoro imenso" encontrar minha amiga portuguesa, Maria, para tomarmos um café e caminharmos pelas ruas da cidade... Ouvir seu belo "purtuguês de Purtugalll" é uma delícia, bem como é muito gostoso poder falar minha tão amada língua.

Foi essa sensação muito gostosa que tive esses dias em alguns encontros com brasileiros muito legais que vivem aqui.


(O super casal anfitrião, Ângela e Kenth e Ângelo de butuca no fotógrafo. Infelizmente não sobreviveu nenhuma boa foto do restante do pessoal que tava no almoço).

Domingo, por exemplo, num almoço muito carinhoso oferecido pela Ângela, uma carioca muito "xenti boa" para seu marido sueco, bem abrasileirado, e aniversariante do dia, o Kenth. Conosco, minha amiga Xu e mais duas brasileiras com seus respectivos maridos, um sueco e um finlandês.

No momento da refeição, dei uma olhada para a grande mesa de oito lugares e pus me a prestar atenção naquelas pessoas todas, que antes não se conheciam, a falar por uns trinta minutos a respeito dos ingredientes da feijoada. Ângela havia se esmerado em buscar linguiças, carnes, feijão, tudo que pudesse estar mais próximo dos sabores de nossa terra.


(O tema do dia: a feijoada da Ângela)

Foi curioso então perceber que o que nos unia ali não era uma amizade antiga. Tampouco eram afinidades eletivas muito fortes, como as que a gente às vezes procura e exige para iniciar um novo encontro. Não. Foi o Português (não o Luiz Felipe, marido de minha amiga Maria), que nos uniu em torno da mesa e o fato de que, como brasileiros, pudemos nos entender (no sentido amplo do termo) tão bem. Pudemos participar e comungar de um "mesmo passado" e uma mesma raíz.


(Cristina, seu simpático marido finlandês, de nome difícil, Kenth e a feijoada)

A mesma língua que fez com que eu me sentisse novamente "em casa" num café amigo oferecido pela Ivone, uma baiana arretada que vive aqui também. Eu já havia sentido a mesma coisa ao conhecer uns dias antes sua jovem e falante irmã, Ivani.

A espontaneidade das duas com certeza tem a ver com seu jeito baiano feliz de ser, com sua educação familiar, mas creio que também com a soltura que a língua lhes permite. O prazer de ouvir gostoso sotaque e o jeito de falar em discurso indireto (e eu disse à minha irma: "Irmã, isso sempre foi assim") das duas e de me expressar livremente não pode ser comparado às conversas que tenho com suecas ou outras imigrantes. O inglês não me permite tal liberdade, ainda que a pessoa seja muito agradável e que eu adore o conteúdo da conversa e eu me divirta com ela.

Falar minha língua materna aqui me causa, por algumas horas, a sensação de estar aí, no Brasil, de novo.

Não só ouvir Português, mas falar Português no dia-a-dia é uma das coisas que mais tenho falta. Com ele posso ser mais engraçada, mais criativa, mais solta, mais inteira e mais firme nas minhas colocações, porque tenho uma variedade gigante de palavras ao meu dispor. E meu desejo "idiota" e irrealizável seria que eu pudesse falar Português com os suecos, enquanto eles falariam sueco comigo, para que houvesse uma troca perfeita. .. Coisa de gente maluca, claro.

Viver fora, ao meu ver, exige a necessidade do mergulho na cultura local, mas esta troca que venho tendo com brasileiros daqui funciona como uma fonte de energia. Faz eu me lembrar da minha terra e dos valores que nós temos. Faz a gente se sentir acolhida de uma forma que só o brasileiro sabe fazer e como a Ângela e seu marido nos fez sentir em sua casa sueco-brasileira.

Sem falsa demagogia ou pensamentos senso comuns demais, a verdade é que esse jeito brasileiro é nosso jeito mesmo. É peculiar e poder ter um pouco disso mesmo estando longe daí, não tem preço.


(Finalmente uma foto dos três juntos. Aqui, na cozinha aconchegante do Kenth e da Ângela)

Para celebrar esse nosso encontro brasileiro, no link ao lado, uma música que aprendi a amar e ouvir aí nas vozes de alguns amigos. A eles (Dri Silveira, Cleber e Elisa) um oi especial!

Comentários

Ed. disse…
Mesmo longe vc me leva há lugares que não conheço, sensações que não vivi ainda (um dia quem sabe)Lendo tudo isso consigo palpar as coisas...
E isso além de todo resto me faz viciar no teu blog!!!!

bjos
sylvia disse…
Somnia ,
Acho que sorte temos nós que encontramos seu blog e você com sua alegria contagiante . Todos os dias venho correndo pro computador , nem que seja por poucos minutos, para me deliciar com seus assuntos que, por mais simples que sejam , conseguem transportar seu leitor para seu mundo mágico .
Bjs
Anônimo disse…
Eu só falo português na net, resto do dia é só francês (e inglês). Há dias que esqueço como se diz cadeira :-)
Somnia Carvalho disse…
hahá!

engraçado esquecer isso! no início aqui eu parecia meio retardada... ficava dizendo: aquele negócio que a gente usa para tirar fotos, como se diz mesmo? e tinha duvida assim o tempo todo.. .rs...

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