("Mãe e criança", escultura de Ron Mueck)
Uma e meia da manhã e o sono se foi.
Rolei por algum tempo antes de vir à sala e iniciar este post, e segui o conselho de especialistas em sono de que é melhor se levantar, resolver as pendências da cabeça e deixar o sono vir de novo do que fritar feito bacon em panela quente.
Enquanto rolava na cama quentinha o post foi me vindo inteirinho na cabeça, sem forçar nem nada... Isso sempre me acontece! Se não quero pensar num post de madrugada, então eu penso em 100 deles e saem todos prontinhos...
É que uma coisa puxa outra e outra e outra, não é mesmo?
Começou assim: pensei em aproveitar ver se Ângelo estava bem cobertinho... Marina estava okey porque eu acabara de lhe dar uma mamadeira e então lembrei de um texto lindo, enviado hoje por uma querida amiga, também mãe, moradora das Suíças, a Gislaine.
Nele, ela falava do amor não dito entre essas criaturinhas pelas quais morremos e nós... e então fui pensando nisso e pensando também no porquê de eu não conseguir mais dormir se dormir era exatamente tudo o que eu queria ontem no fim do dia...
Depois de um dia exaustivo com Marina constipada por ter começado alimentação sólida eu rezava ardentemente para o momento em que a creche estivesse na cama e eu pudesse então descansar sossegada... Tive sucesso na empreitada. Renato ainda passaria num supermercado e consegui que meu sonho se realizasse razoavelmente cedo...
Quando o silêncio se fez na casa, peguei um copo d´água, encostei-me na pia da cozinha, suspirei profundo e olhei as horas... Nove e quinze da noite! Yeah! Hora de ir para a ca-ma!
Quatro horas bem dormidas, para quem está acostumado a dormir picado com choros, é tão bom que traz a gente à sala e aos posts...
Então é nisso que eu refletia.. Sobre essa coisa maluca de ser mãe e ser pai... Sobretudo sobre a maternidade. Sobre como ela é exaustiva e pesarosa em alguns momentos. Em como tudo que desejamos era um minuto para nós mesmos no meio da choradeira, do prepara a comida, limpa a fralda. Ou então, como é comum eu sonhar que não estou em casa e sim na sala de aula toda pomposa e saio de lá toda pimpolha para pensar em outra coisa quando a hora termina.
Quando se é mãe (e também pai) não há descanso. Não há férias dos filhos como dos alunos.
Quando se é mãe você sente como um motor todos os dias que lhe suga todas as forças e energia porque uma criança exige muito, mas muito mais do que qualquer animal de estimação, do que qualquer outro emprego. E há dias em que o sonho é simplesmente que as crianças durmam para que a gente viva... Sim, isso é verdade. E eu estou aqui para dizer a verdade.
Se você pensa em ser mãe e pai por qualquer outro motivo no mundo que não seja uma loucura por ser exatamente mãe e pai, então desista! Não vale a pena! Não é justo! Ou você será como praticamente todos os meus vizinhos e vizinhas que passam o cuidado do seus filhos para babás e empregadas domésticas inclusive no fim de semana.
E você será responsável por mais uma criatura mal amada que amará bem pouco a si mesma e ao mundo menos ainda...
Então é preciso levar em conta o trabalho sim. As noites muito mal dormidas e deixar sonhos simples, antes muito fáceis de se realizar, de lado, como ir assistir "Black Swan" numa noite qualquer com seu marido.
Agora se você está disposto e disposta a abrir mão de si mesmo pela maior parte do tempo, ao menos por um bom tempo, então siga em frente...
Só aviso, com toda sinceridade, o que você vai ter de enfrentar, embora isso não tenha o poder de lhe preparar para o que virá, pois outra verdade é que a maternidade (para o que a gravidez e o nascimento do bebê é apenas a ponta do iceberg) é uma experiência única. Totalmente particular e só possível de ser imaginada quando já vivenciada, apesar dos sintomas envolvidos serem parecidos entre os envolvidos e facilmente debatidos em rodas de discussão.
Ainda assim aviso que eles vão chorar e vão chorar muito! E vão querer sua atenção e vão usar de todas as artimanhas para que você deixe tudo para cuidar deles o tempo todo! A televisão não será sua e quando for você não terá energia para ela! Livros? Vinho e papo cabeça com os amigos? Academia? Hahahá! Com sorte isso virá... Aos poucos, quando eles forem crescendo...
(Para quem está de fora os problemas e a beleza nunca terão o mesmo peso..., visitante admira escultura de Ron Mueck, "Mãe e Filho")
Sim. Os filhos enlouquecem a gente! Eu mesma tinha certeza de que não teria um segundo porque precisava urgente voltar à vida normal e aí um detalhe mudou meu percurso... O detalhe que Ângelo havia me enloquecido. De amor. E fui sentindo em meio ao cansaço do fim do dia como eu podia me sentir tão incrivelmente feliz por tê-lo comigo.
A verdade, amigo e amiga, é que ver uma criança crescendo, assistir diariamente a isso, participar de todos seus dramas é uma coisa tão assustadoramente fantástica que nos tira do mundo dos normais. E se não dermos um basta é possível desejar isso uma, duas, três, inúmeras vezes.
A verdade é que ontem em meio ao esgotamento físico do meu dia eu tive centenas de momentos poéticos, perfeitos, cuja sensação eu quero ter para sempre na memória...
Eles se fizeram quando eu cheirei e beijei e rocei os pezinhos fofos, brancos e cheirosos de Marina, enquanto trocava suas dezenas de fraldas... Quando eu a deitei no colo para niná-la e tive seu olhar encontrado com o meu, junto de um sorriso banguela tão sincero que deixaria de queixo qualquer coração duro. Quando montei tudo e incentivei Ângelo a pintar, em aquarela e enquadrar, o desenho mais bem elaborado feito por ele em três anos, oito meses e dezessete dias.
Essa sensação de "tudo vale a pena" me veio quando perguntei a ele, no meio da tarde, por que o Dan, da tevê, não chamava aquele dinossauro que voa de piterossauro e sim de um nome estranho lá e ele me diz todo reflexivo: "Não mamãe... é que ele é um piterodonte também!".
Sem falar das incontáveis vezes que olho para suas longas pernas e penso como ele tem crescido rápido! E quando ele vem gesticulando, me olhando intensamente e explicando algo como "você sabia que nós somos feitos de madeira?" e todos os dias, TODOS, desde que ele nasceu quando o coloco para dormir ou vejo-0 ali de olhinhos fechados respirando...
É sim uma sensação tão intensa, tão grandiosa, tão abençoada por uma vida que eu só posso deixar que minha vã filosofia tenha dado lugar a reflexões piegas sobre a maternidade, numa madrugada qualquer de uma sexta-feira de primeiro de abril...
Não. Não é piada. Eu amo essa minha vida! E se fosse possível achar uma lâmpada mágica e voltar a quem eu era, éramos, ao que eu tinha antes dessas duas pessoinhas entrarem na minha vida eu jamais aceitaria. Nem por todo o sono do mundo, nem por todo o cinema do mundo...
Depois de ser mãe e ser pai não é possível mesmo nunca mais voltar atrás. E esse é o nosso grande dilema e também nosso maior presente.
Boa noite que são duas e catorze e eu realmente preciso dormir...
Comentários
Grande abraço,
Marinêz
beijo
Porque a vida fica cheia de contradições, pois a gente quer se dar integralmente à criança mas não pode deixar de ser a pessoa que somos.
Por isso digo tanto que ser mãe e ser profissional são incompatíveis, pelo menos até a criança ter uma certa idade pra ir pra escolinha e a gente não sentir que está abandonando-a.
Quem quer colocar filhos no mundo tem que ter a absoluta certeza de que poderá se dar integralmente a eles, o que não é fácil e nem sempre é possível.
Beijos!
Beijos
Provável que nem verá, já que nao tem aprovação prévia de comentários, mas valeu ter lido tudo de novo, enquanto continuo sem ser mãe (ainda) e querendo desfazer das operações de fachada, ahahahaha.
Beijos