(Van Gogh, "Quarto em Arles, 1889)
Minha ida e minha volta do Brasil foi muito diferente do que eu esperava.
Por um lado...
Foi uma sensação muito boa e confortadora ver, conversar, abraçar, rir e acordar junto das pessoas que me são tão caras.
Foi tão tão gostoso encontrar gente que eu não via há tanto tempo, que se deslocou de lá de não sei onde para vir me ver e conhecer o nosso Angelinho.
Foi bom e confortador ser filha de novo depois de ter sido mãe e só pensar no outro e não em mim.
Foi gratificante sentir a doação de algumas pessoas que o fizeram apenas por amor, sem esperar nada em troca.
Foram tantas as demonstrações de afeto, seja por parte dos amigos ou da família, que retribuir à altura seria impossível.
Por outro lado...
Fiquei triste de não sentar no tapete colorido com minha amiga Pinta e conversar sem pressa sobre nós mesmas.
Foi chato entrar e sair correndo de todos os lugares sem agradecer direito ou não ter tido tempo de abraçar com calma gente que eu amo tanto, como minha irmã Sandra.
Lamentei ter de receber todo mundo em tão pouco tempo e esquecer de fazer uma foto com a Andréa e a Sandra segurando o Ângelo...
Eu queria fazer uma lista de quem eu vi rapidamente e a quem eu não pude ouvir as histórias, como a Daníssima, a Elô, a Faditas, o Romans (só para citar uns bem poucos) mas ela seria quase interminável.
Me incomodou ser um tipo de "celebridade" que apenas dá entrevistas rápidas sobre a Suécia, mas não tem tempo de perguntar: "e você?"
Desse ponto de vista e de outros tantos me senti uma estranha no ninho.
Eu sei - e eu sei mesmo - que se hoje eu recebo tanto amor e carinho por parte de tanta gente é porque um dia, graçias a Dios, eu soube plantar essa semente preciosa da amizade e da doação.
Eu sei - e eu sei mesmo - que as pessoas que me conhecem de verdade sabem que eu passei correndo, mas que dentro de mim tem uma gratidão enorme por este amor precioso.
Mas eu também sei que somos um em cada momento da vida e que sentar no tapete agora com minha amiga Pinta, a Dani, ou a Teresa nunca mais será o mesmo... estaremos ali à espreita do que Ângelo, Pedro, Felipe ou a Rosa precisam.
Nossa vida mudou, embora nós ainda sejamos quase as mesmas, em essência.
Essa Sônia "celebridade" fez eu me sentir uma estrangeira no Brasil.
Culpa do blog?
Culpa da publicidade da privacidade?
Do Tempo?
Mea culpa?
Não sei, não sei se importa saber...
Mas dentre tantas razões pensei que talvez porque na Suécia, mais precisamente aqui em Malmö, é que eu tenho aprendido a viver essa nova Sônia.
Porque aqui essa nova vida que busquei faz sentido e é viável por enquanto.
Isso não quer dizer que às vezes eu também não me sinta estranha aqui...
Estrangeira mesmo eu só não me sinto dentro de mim mesma...
quando me volto para aquilo que eu creio que eu seja.
Posso sentir-me bem ou mal em qualquer lugar e este lugar está longe de ser um país ou algo assim.
Sentir-se me bem ou mal é um estado de espírito...
A volta para "casa", essa casa que agora fica a milhares de quilômetros do Brasil no fundo foi voltar para o que hoje representa aquilo que fui construindo a vida toda: o amor, o lar, a companhia de alguém que escolhi passar esses dias super reluzentes ou mais escuros de minha vida. Aqui sou a Sônia por inteiro: a Sônia amiga, mãe, companheira, engraçada e chata, feliz e triste, simpática e insuportável, inteligente e doutora (sim! agora sou doutora) ou imbecil, caprichosa e relaxada, criativa e artista ou cansativamente repetitiva...
De tudo isso, a única coisa que penso agora é que esse lugar, que no fundo é nós mesmos, é o mais importante de se preservar, porque só assim, estando na Suécia, no Brasil ou não importa onde, conseguimos manter o essencial, independente das circunstâncias.
Talvez todos nós tenhamos um quartinho em Arles, onde nos refugiemos, onde tentamos recuperar aquilo em que acreditamos para não que nos percamos de nós mesmos, não importa onde estejamos.
......
Para vocês, um poema ma-ra-vi-lho-so do poeta de sempre, Fernando Pessoa.
Lídia
(Ricardo Reis)
Lídia, ignoramos. Somos estrangeiros
Onde que quer que estejamos.
Lídia, ignoramos. Somos estrangeiros
Onde quer que moremos, Tudo é alheio
Nem fala língua nossa.
Façamos de nós mesmos o retiro
Onde esconder-nos, tímidos do insulto
Do tumulto do mundo.
Que quer o amor mais que não ser dos outros?
Como um segredo dito nos mistérios,
Seja sacro por nosso.
Comentários
Mais um texto profundo de uma estrangeira tão brasileira e de uma brasileira tão estrangeira.
Bjs,
Tia Dri.
Teco.
Bjs